quinta-feira, 7 de outubro de 2004

A cura da homossexualidade

A Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro se apresta a votar um projeto de lei, do deputado Edino Fonseca, que cria o Programa de auxílio às pessoas que voluntariamente optarem pela mudança (...) de sua orientação sexual da homossexualidade para a heterossexualidade.

Para implementar o programa, "o poder público estabelecerá convênios com organizações governamentais, não governamentais, Associações Civis, religiosas, profissionais liberais e autônomos". Ou seja, o dinheiro público financiará os que se propõem a converter homossexuais em heterossexuais.

O projeto afirma que o programa não é discriminatório, pois se destina aos homossexuais que desejarem mudar de orientação. No caso dos menores, a reserva não vale. Não será preciso que os adolescentes homossexuais desejem mudar de orientação, bastará a vontade de pais ou tutores. Seu filho tem trejeitos? Chame o governo; ele dará conta das frescuras do menino.
A Comissão de Constituição e Justiça deu parecer favorável: "A proposição é de relevante cunho social e não esbarra em preceitos constitucionais".

Muito bem, vou fundar o Instituto Michael Jackson para a transformação de negros em brancos (claro, só os negros que quiserem). A idéia é de relevante cunho social e benéfica, visto que, de fato, em nossa sociedade, é melhor ser branco. Uma vez esbranquiçados, os negros ganharão mais e competirão com os brancos em pé de igualdade. OK?

A Comissão da Saúde também deu parecer favorável: "Homem e mulher foram criados e nasceram com sexos opostos para se completarem e procriarem. O homossexualismo, apesar de aceito pela sociedade, é uma distorção da natureza do ser humano normal".

Que coisa estranha; eu sabia que a sexualidade dos animais não humanos era (mais ou menos) natural, já que a fertilidade da fêmea produz os sinais que ativam o desejo do macho (o cio, por exemplo). No caso da gente, não é bem assim. Parece que desejamos por amores, fantasias e inspirações repentinas, que são coisas culturais, não naturais. Também, se homens e mulheres são feitos para "se completarem e procriarem", não entendo por que transam na cozinha, nos elevadores, nos estacionamentos, nos clubes de suingue, na zona, com cinta-liga, colares de couro ou cueca de látex furada.

Agora, se você acha que a sexualidade humana é pervertida, não hesite: promova leis para a reorientação sexual de fetichistas, masturbadores, exibicionistas, freqüentadores de saunas e cinemas pornôs, sadomasoquistas, internautas de salas de sexo virtual e leitores da revista "Private". Já está na hora de fazer o necessário para que todos os cidadãos desejem segundo a natureza.

Durante o século 20, houve governos que, apoiados numa idéia do bem ou da natureza, quiseram reorientar ideológica e sexualmente seus cidadãos. Mandaram (alguns ainda mandam) milhões para campos de reeducação. Console-se: no Rio, será possível apenas financiar a conversão sexual. Sem campos.

Admito que o programa tem um interesse: cria ótimas ocasiões de captação de fundos públicos. Paradoxo chulo, mas irresistível: um projeto para converter homossexuais parece ter sido concebido para dar vontade de mamar.

Exemplo. Eu publico, numa revista conceituada, um artigo em que conto como "converti" homossexuais com terapias intensivas de 12 meses. Logo, meus amigos pais de família cariocas declaram ao programa que eles são atormentados por tórridas fantasias homossexuais e, à noite, erram pelo aterro do Flamengo, procurando prazeres culpados, enquanto as mulheres dormem.

Eles pedem para se curar comigo. O governo do Rio me manda o dinheiro, e a gente divide o lucro. Tratando-se de heterossexuais, os tratamentos serão um sucesso.

Os amigos homossexuais também poderão se tratar comigo no mesmo esquema. Só peço que, no fim, eles se declarem curados, para não estragar a reputação do negócio.

No caso de uma igreja, é mais fácil. Não é preciso escrever nenhum texto "científico". Basta a autoridade da Bíblia. Não faltarão os fiéis para entrar no programa: "Você se molhou sonhando com uma pessoa do mesmo sexo? Cure-se desse demônio". E o dinheiro do governo não será dividido, ficará integralmente com a igreja. Felicitações.

1) Existem sujeitos que vivem sua homossexualidade de maneira dolorosa e conflitiva. Não concordam com seu próprio desejo, por mil razões (inibições, repressão, princípios morais). Qualquer "psi" sabe como é fácil produzir catástrofes subjetivas se, nesses conflitos, a gente não deixa o paciente elaborar livremente sua solução.

2) O governo carioca deveria oferecer tratamento de conversão também aos estrangeiros que, hoje, fazem do Rio de Janeiro uma rentável meca do turismo homossexual. Sugiro que o próprio deputado Fonseca distribua os panfletos do programa, em várias línguas, na Farme de Amoedo, durante o Carnaval.

3) Os pais têm razão de se preocupar ao descobrir que um filho ou uma filha são homossexuais. Afinal, esses jovens têm de enfrentar um mundo em que são propostas leis como a que está para ser votada no Estado do Rio.

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