quinta-feira, 16 de setembro de 2010

O nosso mal-estar amoroso




Faltam homens ou mulheres? E quem está querendo só pegação: os homens ou as mulheres?
NA SEMANA PASSADA, graças ao IBGE (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, migre.me/1hb92), aprendemos que, em média, no país, há 105 homens solteiros por cada cem mulheres com o mesmo estado civil.

Claro, em cada Estado a situação é diferente. No Distrito Federal há mais solteiras do que solteiros, no Rio de Janeiro dá empate e Santa Catarina é o paraíso das mulheres (122 solteiros por cada cem solteiras). De qualquer forma, no Brasil como um todo, é impossível afirmar que "faltam homens no mercado".

A Folha, na última quinta (9/9), entrevistou algumas mulheres; uma delas comentou: pouco importa que haja mais homens do que mulheres, o problema é que os homens, depois de um encontro ou dois, dão "um chá de sumiço". Ou seja, pode haver muitos homens, mas eles só querem pegação.

No domingo passado, um leitor escreveu à ombudsman do jornal para protestar: segundo ele, quem não quer nada sério são as mulheres, que são "fúteis e fáceis", salvo quando o homem começa "a conversar sobre algo sério", aí ELAS dão o tal chá de sumiço.

Em suma, faltam homens ou mulheres? E, sobretudo, números à parte, quem está querendo só pegação: os homens ou as mulheres?

Acredito na queixa dos dois gêneros. Resta entender como é possível que a maioria tanto dos homens quanto das mulheres sonhe com relacionamentos fixos e duradouros, mas encontre quase sempre parceiros que querem apenas brincar por uma noite ou duas. Se homens e mulheres, em sua maioria, querem namorar firme, como é que eles não se encontram?

Haverá alguém (sempre há) para culpar nosso "lastimável" hedonismo -assim: todos esperamos "naturalmente" encontrar uma alma gêmea, mas a carne é fraca.

Homens e mulheres, desistimos da laboriosa construção de afetos nobres e duradouros para satisfazer nossa "vergonhosa" sede de prazeres imediatos.

Os ditos prazeres efêmeros nos frustram, e voltamos de nossas baladas (orgiásticas) lamentando a falta de afetos profundos e eternos.

Obviamente, esses afetos não podem vingar se passamos nosso tempo nas baladas, mas os homens preferem dizer que é por culpa das mulheres e as mulheres, que é por culpa dos homens: são sempre os outros que só querem pegação.

De fato, não acho que sejamos especialmente hedonistas. E o hedonismo não é necessário para entender o que acontece hoje entre homens e mulheres. Tomemos o exemplo de um jovem com quem conversei recentemente:

1) Com toda sinceridade, ele afirma procurar uma mulher com quem casar-se e constituir uma família.

2) Quando encontra uma mulher que ele preze, o jovem sofre os piores tormentos da dúvida: será que ela gostou de mim? Por que não liga, se ontem a gente se beijou? Por que ela leva tanto tempo para responder uma mensagem?

Essa mistura de espera frustrada com desilusão é, em muitos casos, a razão de seu pouco sucesso na procura de um amor, pois, diante das mulheres que lhe importam, ele ocupa, inevitavelmente, a posição humorística da insegurança insaciável: "Tudo bem, você gosta de mim, mas gosta quanto, exatamente?" Se uma mulher se afasta dele por causa desse comportamento, ele pensa que a mulher só queria pegação.

3) Quando, apesar dessa dificuldade, ele começa um namoro com uma mulher de quem ele gostou e que também gostou dele, muito rapidamente ele "descobre" que, de fato, essa nova companheira não é bem a mulher que ele queria.

4) Nessa altura, o jovem interrompe a relação, que nem teve tempo de se transformar num namoro, e a mulher interpreta a ruptura como prova de que ele só queria pegação.

Esse padrão de comportamento amoroso pode ser masculino ou feminino. Ele é típico da cultura urbana moderna, em que cada um precisa, desesperadamente, do apreço e do amor dos outros, mas, ao mesmo tempo, não quer se entregar para esses outros cujo amor ele implora.

Em suma, "ficamos" e "pegamos", mas sempre lamentando os amores assim perdidos, ou seja, procuramos e testamos ansiosamente o desejo dos outros por nós, mas sem lhes dar uma chance de pegar (e prender) nossa mão. Esse é o roteiro padrão de nosso mal-estar amoroso.

Para quem gosta de diagnóstico, é um roteiro que tem mais a ver com uma histeria sofrida do que com o hedonismo.

19 comentários:

  1. Não sou muito de comentar, mas só para constar que despeito Santa Catarina haver mais homens que mulheres, eu tenho uma teoria que caso você encontre um homem que realmente preste: ou é casado, ou é gay, ou é ex de alguma amiga sua...


    hahahaha

    melhor ficar solteira mesmo.

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  2. Boa tarde, Contardo! Gostei tanto do seu post que acabei publicando ele no meu blog!!!

    Obrigada por traduzir em palavras aquilo que eu penso.

    www.reliaquariodasideias.blogspot.com

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  3. Quase não importa a proporção de homens/mulheres. O fato de que sempre há um solteiro/a disponível já pressupõe a fantasia do amor romantico, de que esse pode ser melhor do que aquele. Não vivemos tanto mais sob o dogma do casamento pela sua obrigatoriedade (moral religiosa), o casamento agora é a pura estética com grandes festas milionárias. No entanto, continua representando a durabilidade dos afetos. Enfatizo o casamento porque se tornou o laço, ou as algemas, para evitar a solidão. Se não enganarmos nossa solidão, voltamos às pegações. Ao menos precisamos manter as aparências de que tentamos e com isso culpamos sempre os outros. Mais ou menos por aí...

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  4. É por isso que eu amo o Contardo. Meu Deus! Que brilhantismo é esse? Demais!!!

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  5. Não é nada disso! O texto tenta agradar a gregas e troianos, mas o fato é o que segue:

    "O Ser humano dá valor àquilo que não possui."

    Partindo-se dessa premissa: Mulheres conseguem sexo facilmente com o sexo oposto, basta sair de casa e "estalar os dedos".
    Mas mulher não consegue namoro ou compromisso da outra parte, isto é fato, e vou explicar o porquê.

    O homem por sua vez não consegue sexo (com o sexo oposto) facilmente, (existem prostitutas para essa demanda masculina sem que exista o equivalente para o sexo feminino, o que comprova a tese).
    Já, por incrível que pareça, quase todas as mulheres que se envolvem sexualmente com um homem tendem a se relacionar (namoro).

    Sendo assim, nós homens, desejamos obscessivamente aquilo que nos é privado (sexo fácil e descompromissado), enquanto as mulheres não valorizam isso e querem a parte que lhes falta (compromisso a longo prazo)!

    sem mais.

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  6. Estamos ficando cada vez mais narcisistas, não toleramos qualquer frustração.
    Antes se casava pra sempre, hoje qualquer obstáculo é motivo para desistir, separar...
    Por um lado ganhamos a autonomia de escolher, por outro a desistência, impaciência e não construímos uma relação.
    Ainda não sei se ganhamos ou perdemos, ainda não sei...

    Débora Pissarra

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  7. sei lá ... num dá se contetar apenas com dados estatísticos, as relações hoje não são faceis de se definir. O comportamento de ambos gêneros está em desordem. Nem homem, Nem mulher sabem o que quer...

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  8. Histeria completa. E dizer que se achava que a histeria estava relacionada à repressão?! Hoje, sem repressão, ela parece pior.

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  9. Numa sociedade competitiva e individualista não há espaço para a entrega e a doação, não importando se vinda de homens ou mulheres.

    É uma limitação inerente à humanidade. Muito tempo e esforço dedicados ao "sucesso social" não dão espaço ao sucesso afetivo.

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  10. Eu acho que a grande questão é "não saber amar", amar é dificil como já disseram, pois pressupõe o abandono do ego. Quem realmente quer amar....
    heloísa

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  11. PS: Alam, adorei a ideia do blog, assim como seu visual (as letras e entrelinhas grandonas, além da cor "calma", são uma bênção pros olhos!)!

    Parabéns!!
    Mariella

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  12. não falta homem no mercado.
    as mulheres é que tem a mania de ligar uma lista de exigências absurdas. o vedtibular é mais fácil de passar do que passar por esta lista.
    isso só vai melhorar quando as mulheres realmente largarem os tabus e as proibições sociais.
    todos são lives para se relacionar com quem quiser.

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  13. Beto.
    Entenda o texto. Não é dito sobre as regras que as mulheres seguem e fazem seguir. É sobre que nós, homens e mulheres nos colocamos. Seu comentário é machista.
    Atente para que a maioria dos homens segue esse roteiro de relacionamento.

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  14. Amar alguém, com as qualidades e os defeitos da pessoa, e ainda ser amado de volta da mesma forma é uma loteria. Já deixei relacionamentos no início por perceber que não era o que eu queria e também já levei muito perdido de mulheres que me balançaram bastante. Não basta apenas juntar duas pessoas que querem um relacionamento sério.

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  15. apesar do codinome sem vergonha, dom juan deu uma dentro no sentido d que sim: o desejo nasce da impossibilidade.me parece q existe algo de infantil (digo o infantil-fera-devorador-engulidor do mundo, não o infantil-bilubilu)no embrião do desejo. mas e uma vez satisfeito o desejo? onde desanda? penso q o nascimento do desejo seja assim, quase espontâneo, o desejo vai nascendo, pipocando a cada passo q eu dou, não tenho nada, quero, portanto o tudo. já a manutenção desse mesmo desejo, uma vez satisfeito, tem algo de adulto. de maturação não corpórea mas psíquica. de evolução espiritual, como diriam muitos. e, nesses termos não é q seja uma descrente da humanidade, mas acho q a gente progride beeeem devagar...

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  16. Acredito que sejam estes os motivos de tantos 'desencontros'. Aliado a esses, há um outro ponto importante: expectativa.

    É possível iniciar um relacionamento sem gerar expectativas? Isto é, sem questionar muito sobre sentimentos e "o que está por vir"?

    Ou seja... a solução seria praticar o 'tão famoso' desapego (assunto tão em voga, mas tão pouco 'praticado' hoje em dia)?

    Carla

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